Regras para aluguel por temporada (Airbnb) em condomínios: pode ou não pode?

1. Introdução

O crescimento exponencial das plataformas digitais de hospedagem, como o Airbnb, transformou profundamente o mercado imobiliário brasileiro. A possibilidade de alugar imóveis por curtos períodos, de forma prática e lucrativa, atraiu proprietários e turistas. No entanto, essa nova dinâmica gerou conflitos em condomínios residenciais, especialmente quanto à legalidade da locação por temporada nesses espaços. O presente artigo visa analisar os limites legais do aluguel por temporada em condomínios, à luz da legislação brasileira e da jurisprudência atual, oferecendo subsídios para advogados, síndicos e condôminos.

2. Análise da legislação aplicável

A locação por temporada é regulamentada pela Lei nº 8.245/1991 (Lei do Inquilinato), que em seu artigo 48 define:

“Considera-se locação para temporada aquela destinada à residência temporária do locatário, para lazer, realização de cursos, tratamento de saúde, entre outros, com prazo não superior a noventa dias.”

O Código Civil, por sua vez, estabelece os direitos e deveres dos condôminos:

• Art. 1.228: garante o direito de propriedade, incluindo o uso, gozo e disposição do bem.

• Art. 1.335: impõe deveres aos condôminos, como respeitar a convenção e não prejudicar a segurança e sossego dos demais.

• Art. 1.336, IV: proíbe o uso da unidade de forma prejudicial ao condomínio.

A Constituição Federal, no artigo 5º, inciso XXII, assegura o direito de propriedade, mas esse direito não é absoluto, devendo ser compatibilizado com os interesses coletivos.

3. Discussão dos limites legais

Embora a locação por temporada seja legal, sua prática em condomínios pode ser limitada por regras internas. O artigo 1.351 do Código Civil prevê que alterações na convenção condominial exigem aprovação de dois terços dos condôminos. Assim, se a convenção proíbe expressamente locações por curta temporada ou estabelece uso exclusivamente residencial, o aluguel via plataformas como Airbnb pode ser considerado irregular.

Além disso, a alta rotatividade de hóspedes, o uso comercial da unidade e o descumprimento de regras internas podem configurar desvio de finalidade, contrariando a destinação residencial do imóvel.

4. Exame da jurisprudência

O Superior Tribunal de Justiça tem consolidado entendimento sobre a locação por temporada em condomínios residenciais, especialmente diante da crescente utilização de plataformas digitais como o Airbnb.

Uma decisão paradigmática é o Recurso Especial nº 1.884.483/PR, julgado em 23/11/2021 pela Terceira Turma, sob relatoria do Ministro Ricardo Villas Bôas Cueva. A Corte decidiu que:

“A exploração econômica de unidades autônomas mediante locação por curto ou curtíssimo prazo, caracterizada pela eventualidade e pela transitoriedade, não se compatibiliza com a destinação exclusivamente residencial atribuída ao condomínio.”

A decisão reconheceu que a alta rotatividade de pessoas estranhas ao convívio condominial pode afetar o sossego, a salubridade e a segurança dos moradores, conferindo razoabilidade à restrição imposta pela convenção condominial, desde que respeitado o quórum legal.

Em junho de 2025, no julgamento do Recurso Especial nº 1.954.824/MG, a Terceira Turma do STJ reafirmou esse entendimento, mas com uma nuance importante: o relator, Ministro João Otávio de Noronha, inicialmente votou pela vedação da locação atípica, mas posteriormente reviu seu voto para admitir a prática, desde que não haja proibição expressa na convenção condominial.

Essas decisões demonstram que o ponto central é a destinação do condomínio e o que está previsto na convenção condominial. O direito de propriedade, embora garantido constitucionalmente, pode ser limitado em nome da coletividade condominial, desde que respeitados os princípios da legalidade, razoabilidade e proporcionalidade.

5. Implicações práticas

A controvérsia impacta diretamente diversos atores:

• Proprietários: devem verificar a convenção antes de anunciar o imóvel em plataformas digitais.

• Síndicos: precisam garantir o cumprimento das regras internas e zelar pela segurança.

• Condôminos: podem se sentir inseguros com o fluxo de pessoas estranhas.

• Empresários: devem considerar os riscos jurídicos antes de investir em imóveis para locação por temporada.

Boas práticas incluem: aprovação expressa em assembleia, controle de acesso, comunicação prévia ao síndico e respeito às normas internas.

6. Perguntas frequentes

Para auxiliar na compreensão do tema, abordamos algumas das perguntas mais comuns:

a) O condomínio pode proibir aluguel por temporada via Airbnb?

Sim, desde que a proibição esteja prevista na convenção condominial e tenha sido aprovada por dois terços dos condôminos.

b) Posso alugar meu imóvel por temporada se a convenção não proíbe?

Sim, desde que respeite as regras internas e não prejudique a segurança ou sossego dos demais moradores.

c) A locação por temporada é considerada atividade comercial?

Depende. Se houver alta rotatividade, oferta de serviços e desvio da finalidade residencial, pode ser caracterizada como hospedagem comercial.

d) O condomínio pode aplicar multa por locação via Airbnb?

Sim, caso haja descumprimento da convenção ou regimento interno, o condômino pode ser multado conforme o artigo 1.336, §2º do Código Civil.

e) É necessário registrar o contrato de locação por temporada?

Não é obrigatório, mas é recomendável para garantir segurança jurídica às partes envolvidas.

Conclusão

A locação por temporada em condomínios é um tema que exige equilíbrio entre o direito de propriedade e os interesses coletivos. A legislação brasileira permite esse tipo de locação, mas os condomínios têm autonomia para restringi-la, desde que respeitados os requisitos legais. A jurisprudência do STJ tem reforçado essa possibilidade, destacando a importância da convenção condominial. Recomenda-se que proprietários consultem previamente a convenção e busquem orientação jurídica para evitar conflitos e prejuízos.

Se tiver dúvidas ou precisar de esclarecimentos sobre o tema, você pode entrar em contato:

  • Telefone/WhatsApp: (41) 99917-4460

  • E-mail: atendimentokmitaadvocacia@gmail.com

  • Instagram: @kmitaadvocacia

Referências:

  • BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 1988.

  • BRASIL. Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002. Institui o Código Civil. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 2002.

  • BRASIL. Lei nº 8.245, de 18 de outubro de 1991. Dispõe sobre as locações dos imóveis urbanos. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 1991.

  • SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. Recurso Especial nº 1.884.483/PR. Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva. Terceira Turma. Julgado em 23 nov. 2021. Diário da Justiça Eletrônico, 16 dez. 2021.

  • SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. Recurso Especial nº 1.954.824/MG. Rel. Min. João Otávio de Noronha. Terceira Turma. Julgado em jun. 2025. Diário da Justiça Eletrônico, jul. 2025.

Anterior
Anterior

Animais de estimação em condomínios: o que diz a lei?

Próximo
Próximo

Uso exclusivo de áreas comuns em condomínios: entendendo os limites legais